Direitos Humanos, Questões Sociais Libertárias e Veganismo são alguns dos princípios
O Coletivo Liberte! é um grupo criado recentemente em Recife, com cunho libertário e abolicionista, que pretende, não somente na teoria, mas também na prática, atuar conjuntamente com outros coletivos e movimentos sociais, com base no fato de que o ser humano também é um animal, sendo assim consideram essencial a participação do movimento animalista em movimento sociais humanos.
Atualmente poucos grupos veganos levantam a bandeira das questões sociais humanas de forma explícita e ativa, nesse sentido, o Coletivo Liberte! chega em boa hora para tornar cada vez mais claro a toda sociedade e até mesmo para muitos simpatizantes do movimento animalista o quão próxima é a relação dos Direitos Animais com os Direitos Humanos e que a libertação das espécies virá consequentemente com a libertação humana (e vice-versa).
Conversamos com o Tiago, um dos membros do Liberte! e ele nos contou um pouco sobre os principios e pensamentos do Coletivo, veja o bate-papo abaixo:
Portal Veganismo: Por que o termo “Liberte!” foi escolhido para nomear o Coletivo?
Tiago: Liberte por que é uma palavra que engloba a libertação de todas as formas… tanto a libertação dos animais dos sistemas de uso e exploração atuais como também da libertação humana, contrariando dogmas impostos e em prol de minorias socialmente e históricamente excluídas, como as mulheres, a população negra, as classes populares.
A palavra também foi usada principalmente no sentido de provocar o questionamento em relação a qualquer injustiça: Liberte-se! Liberte! Pense bem… uma imagem de combate ao Racismo e a palavra “Liberte!”, uma imagem de combate ao Machismo e a palavra “Liberte!”, uma ação de combate ao Especismo e a palavra “Liberte!”, isso tem um simbolismo muito forte, essa é a ideia.
Libertar para o respeito, para a justiça, para a luta, para a conquista de direitos!
Portal Veganismo: Interessante. Nós compartilhamos desse ideal também e é com bons olhos que vemos a chegada de mais um grupo vegano que entenda essa essência e levante essa bandeira humana no movimento animalista. Vocês possuem alguma lista de princípios e atividades, algo que represente bem o Liberte! na prática?
Tiago: Acredito que o principal é nosso empenho em realizar ações em conjunto com outros movimentos sociais (independente se esses outros movimentos sociais vão levantar a pauta do veganismo/direitos animais). Temos como exemplo a FIP (Frente Independente Popular) daqui de Recife, é uma Frente que envolve vários coletivos e movimentos sociais que se juntam para lutar por um objetivo em comum.
Entramos na FIP com o objetivo de ajudar e nos integrar com o movimento popular social, sem necessariamente buscar uma troca entre os movimentos, mas com pouco tempo percebemos uma boa aceitação dos militantes em relação aos direitos animais e a tomada de decisão de alguns rumo ao vegetarianismo/veganismo, isso nos deixa animados, é um grande estímulo. A unificação com militantes experientes de outros movimentos sociais vai agregar muito valor ao movimento animalista, nos fazendo alcançar um patamar mais maduro e combativo na luta pelos direitos animais.
Também realizamos exibição pública de filmes em conjunto com a FIP sobre a violência do Estado e da PM, o transporte público, o despejo de famílias (desapropriação de terras) durante e por causa da Copa do Mundo, toda essa “faxina” que estão fazendo com a população, a saúde pública precária, toda essa raiz classista¹ de criminalização da pobreza e a miséria que o sistema atual gera.
Nós acreditamos que temos que fazer ação de base e não apenas protestos, pois se não fizermos, a mídia de massa fará essa ação de base e educará a população da forma capitalista dela, de acordo com seus interesses e não de forma educativa libertária. A ação de base tem que ser do povo para o povo, mostrar e provar para a população, por exemplo, que as pessoas que aparecem na TV (mascaradas ou não) não são criminosas, são ativistas lutando por direitos, pelos direitos do povo.
Não são protestantes sem causa que estão lá apenas para quebrar as coisas, muito menos vagabundos que não querem nada com nada e também que a resposta dos manifestantes só vem após a violência que inicia com a policia, com a opressão do Estado, mas isso a mídia tradicional não conta.
Portal Veganismo: Muito bom seria se todo ativista animalista percebesse a importância de se unir e participar em outros movimentos sociais. A repressão que o movimento #NãoVaiTerCopa sofre hoje do Estado é a repressão que o movimento animalista vai sofrer num futuro breve, a medida que nosso movimento cresce e incomoda.
Na verdade, até já tivemos truculência do Estado em relação ao meio animalista, vide o caso do Instituto Royal, onde o Choque desceu porrada na população que se manifestava nas proximidades e se não fosse os Black Blocs protegerem as pessoas que lá estavam, o massacre teria sido muito maior. E no que tange ao Veganismo o que vocês possuem de atividades para levar a temática a sociedade?
Tiago: Ativismo gráfico, stencil, colagem de cartazes, criação de camisetas temáticas de modo manual, criação de eventos culturais (incentivo a arte de modo geral, exibição de charges, imagens, etc), exibição de filmes, grupos de estudos, como o GEDA, que inclusive contaremos com o apoio de vocês que implantaram o grupo a pouco tempo aí no Vale do Paraíba.
Portal Veganismo: Com certeza, essa troca de experiências é sempre importante e trabalho não vai faltar e como pretendem sustentar tudo isso?
Tiago: Com o empenho dos próprios voluntários, faremos algumas camisetas temáticas para ajudar e quem sabe trabalharemos a ideia de implementar à venda de algum rango vegano como vocês sugeriram.
Portal Veganismo: Falando de uma parte mais técnica e a comunicação visual, por exemplo, o logotipo do Liberte! ele vem como uma forma de trazer um pouco essa essência de Libertação Animal/Humana do Coletivo, certo?
Tiago: Sim, a mão envolvendo o animal representando uma harmonia entre as espécies, mas também o aspecto humano (de Direitos Humanos), são os três pilares. O porco e o símbolo do V representando os Direitos Animais e o Veganismo e essa conexão de todos os símbolos em uma esfera, uma bola, um planeta, representando no caso o Meio Ambiente.
Nossa capa do facebook, por exemplo, mostra o mundo que queremos para o futuro, que acreditamos que um dia chegaremos lá, um mundo mais justo, em harmonia com a natureza, um mundo em paz, o caminho daqui até a paz é longo e árduo e todos querem a paz, mas é importante ressaltar que o grupo não é pacifista, o que não quer dizer que sejamos violentos, muito pelo contrário.
Portal Veganismo: Um mundo onde os animais sejam respeitados não existirá sem uma enorme opressão e perseguição por parte dos exploradores, sem dúvidas, o movimento ambientalista é uma prova atual disso. O número de ambientalista, perseguidos e mortos é cada vez maior.
Tiago: A questão é que para se chegar a paz teremos muito trabalho, muita luta, afinal, para defender nossos ideais libertários, em algum momento teremos que partir para o enfrentamento, seja ideológico ou físico, podemos notar isso nas ruas mesmo, nas manifestações atuais, onde o povo ao se rebelar contra as injustiças é coibido com a violência do Estado, nós não queremos a Copa, mas os grandes querem, quando saímos as ruas para falar sobre isso o Estado tenta nos calar através da violência e consequentemente num futuro teremos um mesmo enfrentamento no movimento de direitos animais e a libertação dos animais não virá apenas de informação e pedidos de “por favor” e sim de luta, de um movimento social. Os exploradores que lucram com a exploração de animais irão nos atacar e nós teremos que nós defender, logo o enfrentamento será um fato.
Portal Veganismo: Exatamente, muitas pessoas acordaram para isso após as mobilizações contra o Instituto Royal esperamos que cada vez mais as pessoas se atentem para esse fato. E você tem alguma consideração final, em nome do grupo? Algum recado para as pessoas, para o meio animalista?
Tiago: Tenho sim, gostaria de reforçar que é fundamental a união entre movimentos sociais e que nós participamos de várias pautas de reivindicações humanas, independente, se tiver ligação direta com o Veganismo ou não, visto que consideramos importante nos engajar nas lutas populares libertárias, participamos por que sentimos que é necessário, que faz parte do movimento animalista participar de outros movimentos sociais, independente se as pessoas vão se envolver no movimento animalista devido a nossa participação ou não. E nosso foco maior é o veganismo abolicionista, é claro.
E quanto a mensagem final cito o trecho da Paula Pardillos, trecho que foi tirado de um artigo publicado originalmente no Portal Veganismo:
“Para alcançar a libertação animal, sejam estes animais humanos ou não, é imperativo que saiamos da lógica do consumo, e comecemos a propor a reflexão ética de fato, se esperamos um dia alcançar a tão almejada libertação pois, se não o fizermos, estamos esperando que quem o faça? – Paula Pardillos”
Observações:
¹ Classismo: é preconceito ou discriminação com base na classe social . Inclui atitudes e comportamentos individuais, os sistemas de políticas e práticas que são criadas para beneficiar as classes superiores, em detrimento das classes mais baixas.
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