…e seus ingredientes em animais, bem como sua comercialização
A legislação europeia referente a proibição dos testes de cosméticos em animais é rebuscada e confusa e tem gerado controvérsia com relação ao seu entendimento. Esboço o presente artigo com vistas a um melhor entendimento sobre a matéria.
A legislação europeia referente ao uso de animais em testes cosméticos pode ser entendida como uma queda de braço entre o Parlamento Europeu (que expressa os anseios da sociedade europeia) e a Comissão das Comunidades Europeias (fortemente influenciada pelas indústrias de cosméticos), sendo o Conselho Europeu seu balizador.
A Diretiva Cosméticos
A Diretiva Europeia 76/768/CEE de 1976 (“Diretiva Cosméticos”) estabeleceu os principais aspectos pertinentes à indústria de cosméticos no âmbito da UE, com relação às embalagens, à rotulagem, às substâncias que podem ou não entrar em sua composição, aos limites aceitáveis de presença de determinados produtos, aos produtos que entraram ou não em contato com mucosas, etc. A referida Diretiva trazia em seu texto que os produtos cosméticos colocados no mercado europeu não deviam ser susceptíveis de prejudicar a saúde humana quando aplicados em condições normais de aplicação (Artigo 2º), no entanto, não estipulava a necessidade de testes da segurança dos cosméticos em animais, voluntários humanos ou métodos substitutivos.
A Diretiva Cosméticos sofreu diversas emendas entre 1976 e 2008, na maior parte acrescentando ou retirando substâncias das listas de produtos a serem ou não utilizados como ingredientes, porém, de especial relevância para nosso estudo são a sexta emenda (Diretiva 93/35/CEE) e a sétima emenda (Diretiva 2003/15/CE). Em 2009 ela foi substituída pela Nova Regulamentação de Produtos Cosméticos (EU CosmeticRegulation 1223/2009), no entanto, em grande parte essa Regulamentação nada mais fez do que tentar consolidar e simplificar todas as diretivas existentes até então de forma que ela se encaixasse na legislação de cada Estado-Membro.
A sexta emenda (Diretiva 93/35/CEE) de 14 de junho de 1993, pretendia acrescentar um pequeno ganho à causa animal ao alterar o artigo 4º da Diretiva 76/768/CEE, proibindo assim a colocação no mercado de “ingredientes ou combinações de ingredientes (em cosméticos) experimentados em animais”, fixando a data para sua entrada em vigor o dia 1º de Janeiro de 1998. Mas a sexta emenda mostrou-se falha e inefetiva, ao estilo bem-estarista, por acrescentar elementos que permitiam uma burlagem do sistema.
A referida diretiva trazia uma ressalva: “Se os progressos realizados no aperfeiçoamento de métodos satisfatórios para substituir a experimentação em animais forem insuficientes, nomeadamente nos casos em que os métodos experimentais alternativos não tenham, apesar de todos os esforços razoáveis, sido cientificamente validados como oferecendo um nível equivalente de proteção do consumidor, tendo em conta as diretrizes da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em matéria de testes de toxicidade, a Comissão das Comunidades Europeias apresentará, o mais tardar em 1º de Janeiro de 1997, um projeto de medidas para adiar a data de execução desta disposição por um período suficiente, mas nunca inferior a dois anos . . .”
Trazia também um compromisso: “A Comissão Europeia apresentará anualmente ao Parlamento Europeu e ao Conselho um relatório sobre os progressos alcançados em matéria de desenvolvimento, validação e aceitação legal de métodos que possam substituir a experimentação animal. Esse relatório conterá dados precisos sobre o número e o tipo de experiências de produtos cosméticos em animais. . . A Comissão cuidará mais especialmente do desenvolvimento, validação e aceitação legal dos métodos experimentais que não utilizem animais vivos”.
Antes mesmo de apresentar o relatório de que trata a Diretiva 93/35/CEE (e aparentemente sem conhecimento do Parlamento Europeu), a Comissão das Comunidades Europeias aprovou a Diretiva 97/18/EC, de 17 de abril de 1997, onde altera a data para proibição da colocação no mercado de ingredientes ou combinações de ingredientes de cosméticos testados em animais, de 1º de Janeiro de 1998 para 30 de Junho de 2000.
O relatório apresentado pela Comissão Europeia em 05 de maio de 1997 (portanto, com atraso de 5 meses) intitulado “1996 Commission Report on the Development, Validation and Legal Acceptance of Alternative Methods to Animal Experiments in the Field of Cosmetics” (COM (97)182 Final) apresenta uma série de estatísticas demonstrando a diminuição no número de animais utilizados para testes de cosméticos, bem como os avanços em relação aos métodos substitutivos na área dos testes de irritação ocular e absorção percutânea, entre outros, mas termina por concluir que os métodos existentes até aquele momento não permitem a completa substituição de animais em testes toxicológicos de cosméticos e seus ingredientes combinados. A Comissão Europeia propôs postergar a data para essa abolição até 1º de Junho de 2000.
O relatório não foi bem recebido pelo Parlamento Europeu, que em 24 de setembro de 1997 publicou uma resolução (COM(97) 0182 C4-0369/97) lamentando profundamente que o Conselho das Comunidades Europeias tenha aceitado a proposta da Comissão Europeia, visando adiar para 1º de Junho de 2000 a data de entrada em vigor da proibição das experiências de produtos cosméticos em animais, bem como o atraso da apresentação da proposta de diretiva ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativa aos produtos acabados, prevista desde longa data (aparentemente o Parlamento não havia tomado conhecimento da Diretiva 97/18/EC, pois sua Resolução não a cita de forma alguma, nem faz referências à data de 30 de Junho de 2000). Vemos então que, confusamente, estamos lidando com duas datas distintas, 1º de Junho de 2000 e 30 de Junho de 2000.
Lamentou também que, mesmo decorridos mais de quatro anos após a adoção da Diretiva 93/35/CEE, a Comissão ainda não estivesse em condições de apresentar dados estatísticos precisos sobre as experiências de produtos cosméticos em animais efetuadas no âmbito da União Europeia, bem como a insuficiência dos progressos realizados no domínio da substituição da experimentação animal por métodos alternativos, perguntando-se, de fato, foram enviados todos os esforços razoáveis para desenvolver e validar esses métodos. A Resolução COM(97) 0182 C4-0369/97 é um documento com ótimas considerações a respeito do tema.
O Parlamento Europeu então solicitou à Comissão Europeia:
i – apresentar, sem demora, proposta de Diretiva prevendo a proibição de testes em animais de produtos cosméticos acabados a partir de 1º de Janeiro de 1998;
ii – incluir nessa proposta de Diretiva uma data fixa para a extensão dessa proibição de testes aos ingredientes cosméticos, que não deverá em caso algum ser posterior ao ano de 2000;
iii -que tome medidas positivas e urgentes no que se refere à busca de métodos substitutivos referentes à toxicidade aguda e crônica, à carcinogenicidade, à teratogenicidade e à toxicidade reprodutiva e da validação dos mesmos;
iv – que evite novos atrasos no que se refere à aplicação da proibição e à aceitação de métodos alternativos válidos que resultem de esforços tendentes a obter a mais ampla aceitação possível a nível internacional;
v – que tome medidas imediatas para que os Estados-Membros respeitem a obrigação de recolher os dados estatísticos referentes aos testes de produtos cosméticos em animais;
vi – envolver de maneira mais estreita as indústrias nesse processo de desenvolvimento de métodos substitutivos e sua validação, de modo a apressar o processo.
Dentre outras reclamações em relação ao relatório da comissão de 1996 consta que a Diretiva 93/35/CEE não previa a aceitação de atrasos em relação à aplicação de métodos substitutivos e que a não utilização dos métodos alternativos disponíveis é contrária à Diretiva 86/609/CEE (relativa à aproximação das disposições legislativas, regulamentares, e administrativas dos Estados-Membros respeitantes à proteção dos animais utilizados para fins experimentais e outros fins científicos), lembrando também aos que impõe dificuldades à validação de métodos alternativos que tampouco as experiências em animais foram validadas.
De fato, eis um ponto chave em relação a discussão, pois as exigências de validação de métodos de ensaios que não utilizem animais jamais foram aplicados à própria experimentação animal, que pelo ponto de vista racional tampouco é um método científico. Já tive a oportunidade de questionar tal processo de validação em textos anteriores (“A experimentação animal e as leis referentes” e “Métodos Alternativos“). De que forma validar determinado método tomando como base um método que jamais foi validado?
Um segundo adiamento por parte da Comissão das Comunidades Europeias, por meio da Diretiva 2000/41/CE de 19 de Junho de 2000, estabeleceu como data final para a proibição dos testes de ingredientes ou combinações de ingredientes para produtos cosméticos em animais não mais 30 de Junho de 2000, mas 30 de Junho de 2002.
Vemos, portanto, que a sexta emenda à Diretiva Cosméticos (93/35/CEE) era falha, pois dava brechas a que a proibição aos testes de cosméticos e seus ingredientes em animais estivesse condicionada à existência de métodos substitutivos, bem como sua validação, o que ocasionava em infindáveis postergações (até 19 de Junho de 2000 apenas três métodos alternativos haviam sido validados na Europa, como bem se nota na 5º consideração da Diretiva 2000/41/CE).
A segunda modificação relevante para a Diretiva Cosméticos foi a sétima emenda, à Diretiva 2003/15/CE, de 27 de fevereiro de 2003. Essa Diretiva reincide no erro do bem-estarismo ao proibir “A colocação no mercado de produtos cosméticos que contenham ingredientes ou combinações de ingredientes que . . . tenham sido objeto de ensaios em animais mediante a utilização de um método que não seja um método alternativo após ter sido validado e aprovado a nível comunitário, tendo em devida consideração o desenvolvimento da validação no âmbito da OCDE”.
Onde está o erro? O entendimento em relação ao que sejam “métodos alternativos”. Na acepção óbvia do termo “alternativas”, elas implicam nos métodos de pesquisa, ensaios e testes que não utilizam animais; mas há um segundo entendimento em relação ao termo, bem menos óbvio e honesto, que implica em “alternar” experimentos com animais com outros métodos que não utilizam animais, conforme o conceito dos 3R´s estipulado por W.M.S. Russel e R.L. Burch em 1959.
Nesse conceito estão compreendidos métodos que utilizam animais de forma “refinada” (Refinement), ou que reduzem significativamente o número de animais utilizados (Reduction). Já critiquei o conceito em textos anteriores, como em “Métodos Alternativos“, por isso não me estender sobre essa critica.
Porém, no que diz respeito à legislação referente aos testes de cosméticos, não há duvida de que o entendimento de “métodos alternativos” se referia, até anteriormente à Diretiva 2003/15/CE, às alternativas de fato, ou seja, aos métodos substitutivos. Bom indício disso é que o termo “métodos alternativos” aparece em todas essas Diretivas anteriores associado à substituição completa dos animais nos testes, bem como à proibição dos testes em animais.
A Diretiva 93/35/CEE de 1993 cita claramente que “a Comissão cuidará mais especialmente do desenvolvimento, validação e aceitação legal dos métodos experimentais que não utilizem animais vivos” . . . “Se os progressos realizados no aperfeiçoamento de métodos satisfatórios para substituir a experimentação em animais forem insuficientes, nomeadamente nos casos em que os métodos experimentais alternativos não tenham, apesar de todos os esforços razoáveis, sido cientificamente validados como oferecendo um nível equivalente de proteção do consumidor, tendo em conta as diretrizes da OCDE . . .”
A Decisão nº 1513/2002/CE do Parlamento e do Conselho Europeu tratam de “validação de processos alternativos de ensaio sem recursos à utilização de animais”.
Ainda, em sua revisão em relação às Diretivas anteriores, a própria Diretiva 2003/15/CE coloca: “Todavia, essas disposições [anteriores] apenas dizem respeito aos métodos alternativos que não utilizam animais e não têm em conta os mesmos métodos desenvolvidos com o objetivo de reduzir o número de animais utilizados nas experiências, ou de diminuir o seu sofrimento.”.
Portanto, é a Diretiva 2003/15/CE que inicialmente trata como “alternativas” também os métodos que utilizam animais, no que diz respeito aos cosméticos “ . . . de forma a prever a utilização sistemática de métodos alternativos que reduzam o número de animais utilizados ou atenuem o sofrimento causado, nos casos em que ainda não existam alternativas de substituição total . . .”.
Assim, mediante tal Diretiva os Estados-Membros proíbem:
– A colocação no mercado de produtos cosméticos cuja formulação final, ou que contenham ingredientes ou combinações de ingredientes que, tenham sido objeto de ensaios em animais mediante a utilização de um método que não seja um método alternativo, alternativo após ter sido validado e aprovado a nível comunitário, tendo em devida consideração o desenvolvimento da validação no âmbito da OCDE (Artigo 4º A, nº 1, alíneas a e b);
– A realização, em território da UE, de ensaios em animais para os produtos cosméticos acabados (Artigo 4º A, nº 1, alíneas c), a partir de 11 de setembro de 2004;
– A realização, em território da UE, de ensaios em animais para os ingredientes ou combinações de ingredientes, o mais tardar na data em que seja exigido que sejam substituídos por um ou mais dos métodos alternativos validados constantes do anexo V da Diretiva 67/548/CEE do Conselho, de 27 de Junho de 1967, ou do anexo IX da própria Diretiva 2003/15/CE (Artigo 4º A, nº 1, alíneas d), a partir de 11 de março de 2009.
A data limite estabelecida de 11 de março de 2009 trazia a exceção dos ensaios de toxicidade de dose repetida, toxicidade reprodutiva e toxico cinética, para os quais a data limite estabelecida foi de 11 de março de 2013.
No entanto, a Diretiva era clara em declarar: “Em circunstâncias excepcionais, em que surjam graves preocupações no que diz respeito à segurança de um ingrediente cosmético existente, os Estados-Membros podem solicitar à Comissão uma prorrogação [no prazo para banimento]. O pedido deve incluir uma avaliação da situação e indicar as medidas necessárias. Nesta base, a Comissão poderá, após consulta ao SCCNFP (Comitê Científico dos Produtos Cosméticos e dos Produtos Não Alimentares Destinados aos Consumidores), através de uma decisão fundamentada, autorizar a prorrogação . . .” ou seja, novamente a emenda permitiria infindáveis prorrogações no prazo para banimento . . .
No entanto, no caso de uma proposta de postergação, essa deveria ser realizada “o mais tardar dois anos antes do término do prazo máximo”, ou seja, deveria ter sido realizada até 11 de março de 2011.
EU CosmeticRegulation (EC 1223/2009)
Com a entrada em vigor dos efeitos da Diretiva 2003/15/CE, em 11 de março de 2009, sentiu-se a necessidade de unificar toda a rebuscada legislação incidente em um único corpo. Surgiu assim a EUCosmeticRegulation (EC 1223/2009) ou Regulamento (CE) nº 1223/2009, de 30 de novembro de 2009 e que passou a vigorar em 11 de julho de 2013.
O Regulamento basicamente substitui a Diretiva 76/768/CEE e suas emendas, tendo como objetivo declarado “simplificar os procedimentos e racionalizar a terminologia, reduzindo assim os encargos administrativos e as ambiguidades . . . {além de reforçar] . . . determinados elementos do quadro regulamentar aplicável aos cosméticos, tais como o controle no mercado, tendo em vista assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana.”
O Regulamento, no entanto, não interfere significativamente no que se refere ao estipulado pela Diretiva Cosméticos em relação ao fim dos testes em animais, sendo que ele não posterga a data fixada de 11 de março de 2009 (ou 11 de março de 2013 para os testes de toxicidade por doses repetidas, à toxicidade reprodutiva e à toxicocinética).
Certamente o Regulamento é bem-estarista, pois continua a considerar como “alternativas” não apenas os métodos substitutivos, mas também as normas que regem a experimentação animal conforme se pode ler no Artigo 18º referente aos “Ensaios em Animais”, onde diz que “são proibidas as seguintes operações:
a) A colocação no mercado de produtos cosméticos cuja formulação final, para cumprir os requisitos do presente regulamento, tenha sido objeto de ensaios em animais mediante a utilização de um método que não seja um método alternativo já validado e aprovado a nível comunitário, tendo em devida consideração o desenvolvimento da validação no âmbito da OCDE;
b) A colocação no mercado de produtos cosméticos que contenham ingredientes ou combinações de ingredientes que, para cumprir os requisitos do presente regulamento, tenham sido objeto de ensaios em animais mediante a utilização de um método que não seja um método alternativo já validado e aprovado a nível comunitário, tendo em devida consideração o desenvolvimento da validação no âmbito da OCDE;
c) A realização, na Comunidade, de ensaios de produtos cosméticos acabados em animais, para cumprir os requisitos do presente regulamento;
d) A realização, na Comunidade, de ensaios de ingredientes ou combinações de ingredientes em animais, para cumprir os requisitos do presente regulamento, após a data em que seja exigida a substituição desses ensaios por um ou mais métodos alternativos validados enumerados no Regulamento (CE) n.o 440/2008 da Comissão, de 30 de Maio de 2008, que estabelece métodos de ensaio nos termos do Regulamento (CE) n.o 1907/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo ao registro, avaliação, autorização e restrição de substâncias químicas (REACH) (15), ou no anexo VIII do presente regulamento.”
Apesar disso, o próprio texto do regulamento declara expressamente: “A Comissão estabeleceu calendários com prazos até 11 de Março de 2009 para a proibição da comercialização de produtos cosméticos cuja formulação final, cujos ingredientes ou cuja combinação de ingredientes tenham sido ensaiados em animais, e para a proibição dos ensaios atualmente executados em animais. Tendo, contudo, em vista os ensaios relativos à toxicidade por doses repetidas, à toxicidade reprodutiva e à toxicocinética, é adequado que o termo do prazo para a proibição da comercialização de produtos cosméticos em que os referidos ensaios hajam sido utilizados seja 11 de Março de 2013. Com base em relatórios anuais, a Comissão deverá ser autorizada a adaptar os calendários dentro dos prazos atrás referidos.”
Assim, embora tanto a Diretiva 2003/15/CE quanto o Regulamento (CE) nº 1223/2009 interpretem o termo “alternativas” como sendo o conceito dos 3R´s, está claro que as datas de 11 de março de 2009 e 11 de março de 2013 dizem respeito a proibição completa da experimentação animal de qualquer tipo a partir dessas datas, no que diz respeito aos cosméticos e seus ingredientes. As exigências referentes aos ensaios em animais contidas no Artigo 18º dizem respeito, portanto, ao período anterior a 11 de março de 2013, ou aos casos excepcionais em que caberia uma derrogação.
Também constava, do referido Regulamento, possibilidade de postergar o banimento, até a data limite de 11 de março de 2011, o que não foi feito. Portanto, para todos os efeitos, entende-se que sim, os testes de cosméticos e seus ingredientes, bem como sua comercialização, estão banidos da União Europeia.
O Regulamento porém, contém algumas brechas, sendo uma delas:
“Em circunstâncias excepcionais em que surjam graves preocupações no que diz respeito à segurança de um ingrediente existente que entra na composição de um produto cosmético, os Estados-Membros podem solicitar à Comissão uma derrogação do n.º 1.
O pedido deve incluir uma avaliação da situação e indicar as medidas necessárias. Nesse contexto, a Comissão pode, após consulta do CCSC [Comitê Científico da Segurança dos Produtos de Consumo] e por decisão fundamentada, autorizar a derrogação. Essa autorização deve estabelecer as condições associadas à derrogação em termos de objetivos específicos, de duração e de comunicação de resultados.
A derrogação só pode ser concedida se:
a) O ingrediente for largamente utilizado e não puder ser substituído por outro ingrediente apto a desempenhar funções semelhantes;
b) O problema específico de saúde humana for fundamentado e a necessidade de efetuar ensaios em animais for justificada mediante um protocolo de investigação pormenorizado proposto para servir de base à avaliação.”
Pós 11 de março de 2013
As opções avaliadas pela Comissão das Comunidades Europeias estavam entre manter a proibição, adiar essa medida mais uma vez ou introduzir um mecanismo de derrogação. O dia 11 de março de 2011 passou e não houve qualquer atividade no sentido de postergar, mais uma vez, o banimento dos testes em animais para produtos cosméticos e seus ingredientes.
A derrogação implicaria em um esforço por parte dos fabricantes em justificar caso a caso cada ingrediente cujo teste deveria continuar sendo realizado em animais. Ela ainda pode ocorrer, e por esse motivo a legislação aplicável ainda deve ser considerada bem-estarista, no entanto, entende-se que o esforço dispendido pelo fabricante para cada caso deverá desestimular o uso de tal recurso. No entendimento que se tem, é obrigação do fabricante colocar no mercado formulações com ingredientes seguros, se a segurança o produto não puder ser demonstrada, o produto simplesmente não poderá ser colocado no mercado.
A decisão da Comissão, obviamente pressionada pela opinião publica, foi de que é mais adequado deixar que a proibição entre em vigor, sem apresentar qualquer proposta legislativa que adie esse prazo. Essas considerações estão bastante claras no documento de 11 de março de 2013, Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a Proibição da Experimentação em Animais e a Proibição da Comercialização e a Situação Atual em Relação aos Métodos Alternativos no Domínio dos Cosméticos” [COM (2013) 135 final].
Embora a ausência de métodos alternativos tenha sido utilizada nas demais ocasiões para justificar as postergações anteriores, e do entendimento geral ser de que “uma avaliação completa da segurança no domínio dos cosméticos apenas com base em abordagens e métodos alternativos não foi ainda conseguida e que, em certos aspectos, nem sequer está próxima a possibilidade de ser conseguida” o entendimento desta vez foi de que mesmo não existindo tais métodos, a proibição deveria ser levada a cabo.
Ao menos no que diz respeito aos cosméticos, a abolição do uso de animais não está condicionada à existência de métodos alternativos. A Comissão declara que “a completa substituição de animais por métodos alternativos ainda não é possível”, no entanto, ainda assim decide pela proibição, pois: “as considerações relativas ao bem-estar dos animais estão na origem das primeiras disposições adotadas em relação à proibição de comercialização de produtos cosméticos testados em animais, que foram introduzidas há 20 anos.
A proibição de comercialização, introduzida pela primeira vez em 1993, com um prazo de aplicação em 1998, foi adotada com o objetivo político claro de pôr termo aos ensaios em animais para produtos cosméticos, sem se basear numa estimativa científica de quando estaria disponível um conjunto completo de métodos alternativos. Do mesmo modo, o Parlamento Europeu e o Conselho impuseram a proibição à realização de ensaios e a proibição de comercialização de 2009 com pleno conhecimento de que, na altura, não seria possível conseguir substituir totalmente os ensaios em animais. O Parlamento Europeu e o Conselho não condicionaram a proibição de comercialização de 2013 à disponibilidade de um conjunto completo de métodos substitutivos . . .”
Uma segunda consideração que foi feita é a de que enquanto condicionarmos o fim da experimentação animal à existência de métodos alternativos, mais tempo levaremos para desenvolvê-los: “A experiência adquirida demonstra claramente que quaisquer disposições em matéria de experimentação em animais constantes da legislação relativa aos cosméticos têm constituído um acelerador crucial no desenvolvimento de métodos alternativos”[COM (2013) 135 final].
Para efeito de comparação, entre 1998 e 2002, apenas 06 métodos alternativos haviam sido registrados, mas entre 2003 e 2009 registraram-se 13 novos métodos. Diz o ditado, a necessidade é a mãe da invenção. Os banimentos certamente provocarão que novos métodos sejam desenvolvidos e validados em um futuro próximo.
Resumindo a matéria:
Proibição de realização de ensaios de produtos cosméticos acabados em animais na União Europeia – 11 de setembro de 2004.
Proibição de realização de ensaios de ingredientes para produtos cosméticos em animais na União Europeia – 11 de março de 2009.
Proibição de comercialização de produtos cosméticos e ingredientes que tenham sido testados em animais na União Europeia – 11 de março de 2009.
Exceções: testes de toxicidade por doses repetidas, toxicidade reprodutiva e toxicocinética foram proibidos apenas a partir de 11 de março de 2013.
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